Roberto Gameiro
Há muitos anos, numa noite chuvosa, estava eu saindo de um sanitário de posto de combustível de estrada, quando dei de frente com um senhorzinho que me olhou com um olhar de tristeza, abatido, debilitado, e me perguntou: “o senhor é sacerdote?". Rapidamente, respondi que não, segui em direção ao meu carro e parti. Até hoje, quando me lembro desse episódio, dói-me até a alma. Acredito que ao me perguntar se eu era sacerdote, ele procurava alguém que pudesse ouvi-lo, escutar com bondade as suas possíveis mazelas e, talvez, apaziguar o seu coração. Ora, mesmo sem ser sacerdote, eu poderia tê-lo ouvido e ajudado.
Rubem Alves (1933-2014), educador e teólogo brasileiro, escreveu no seu texto “A Escutatória”: “Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir”. E acrescentou, com a sabedoria que lhe era peculiar, que: "Deus é isto: A beleza que se ouve no silêncio. Daí a importância de saber ouvir os outros: a beleza mora lá também”.
No processo de formação de nossos filhos, as competências ligadas à comunicação devem ocupar um espaço privilegiado, com ênfase na habilidade de saber ouvir os outros.
Nos relacionamentos pessoais, sociais e profissionais, a “escutatória” faz por merecer atenção tão ou mais importante que a “oratória”.
Que triste é a figura de uma pessoa que não lhe permite terminar a sua fala, a sua argumentação, e o interrompe intempestivamente. Pior se você for subordinado a essa figura, ou, ainda, se for seu marido ou sua esposa, companheiro ou companheira.
Então, o “saber ouvir” deve ser antecedido por uma atitude de predisposição a fazê-lo. Isso significa postura constante de abertura ao diálogo, na qual, ao “ouvir de verdade”, você procura se colocar no lugar do outro respeitando a individualidade dele, seus sentimentos, seus pontos de vista e seus argumentos (mesmo que você não concorde com eles).
Saber ouvir o outro é sinal de respeito, de bondade, de acolhida, de valorização do outro, de abertura ao diálogo franco e verdadeiro, constituindo característica positiva dos verdadeiros líderes, aqueles que conseguem fazer a diferença nos diversos segmentos da sociedade; ouvindo, completam-se, corrigem-se, aprimoram-se.
Como disse Mahatma Gandhi (1869-1948): “Não precisamos apagar a luz do próximo para que a nossa brilhe”.
Publicado originalmente em 21/11/2018
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Roberto Gameiro é Mestre em Administração com ênfase em gestão estratégica de organizações, marketing e competitividade; habilitado em Pedagogia (Administração e Supervisão); licenciado em Letras; pós-graduado (lato sensu) em Avaliação Educacional e em Design Instrucional. Contato: textocontextopretexto@uol.com.br
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